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Loucas e controladoras: por que as mães maduras são odiadas nos filmes?

Brenda Fucuta

14/12/2019 04h00

A atriz Julie Hagerty vive a mãe de Scarlett Johansson no filme "História de um Casamento" da Netflix (Divulgação)

Mães são entidades sagradas, especialmente no Brasil. Veja na publicidade: as mães defendem seus filhos como leoas, tudo suportam como criaturas resignadas e, nos últimos anos, até adquiriram poderes extraordinários ao assumir múltiplas tarefas para manter a família nutrida e unida. Esse talvez seja o único papel social feminino que atravessou intacto as últimas décadas: o da mãe heroína.

Mas existe uma categoria de mães de que a publicidade, o cinema e os seriados (a tal da mídia) não gosta muito: a mãe das mães. Elas são representadas como dominadoras, controladoras, psicóticas. A Netflix é uma vitrine de todos esses tipos, como a mãe da Scarlett Johansson no filme "História de Um Casamento", por exemplo, ou a rainha mãe, em "The Crown", sobre a rainha Elizabeth da Inglaterra. A mãe da Amy Adams no seriado "Sharp Objects" (baseado no livro "Objetos Cortantes"), da HBO, é uma top doida que envenena as filhas. Outro exemplo é a irresistível sogra má Meryl Streep do seriado "Big Little Lies", do mesmo canal, que também conta com outra mãe maluca, a mãe da personagem Bonnie (Zoë Kravitz). Quando a mãe das mães é a sogra, a situação piora muito. Sogras são intrometidas e possessivas.

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Em que momento a santificada mãe se transforma em uma figura detestável, que oprime a filha adulta, o genro legal e até o marido submisso? Na vida real, a gente pode até supor que esse momento coincida com a menopausa, quando as mulheres perdem o valor da reprodução que, por milênios, foi tido como a razão da sua existência no mundo. Não sei se você sabe, mas a menopausa é um estado incomum na natureza. Apenas entre humanos e entre alguns cetáceos as fêmeas deixam de reproduzir em determinada etapa da vida.

Para que isso aconteça, o corpo da mulher interrompe de forma brusca o sistema de liberação de hormônios femininos. Oito em dez mulheres na menopausa ficam deprimidas, irritadas e acaloradas. Mais um motivo para serem vistas como difíceis.

É só uma hipótese, uma tentativa de explicação para essa imagem tão negativa que colou nas mulheres maduras. (Curiosamente, na ciência, a menopausa humana costuma ser justificada como uma força evolutiva: deixando de reproduzir, a mulher mais velha deixa de concorrer com a nora e ajuda no cuidado das crianças dos filhos.)

Estereótipos são ruins mesmo quando enaltecem as mulheres. Mães divinas não existem, mães imperfeitas, sim. Se essas imperfeições fossem retratadas em vez de escondidas, a gente com certeza se sentiria menos culpada toda vez que algo não funciona como idealizamos: o bebê que não para de chorar ou que come pouco, a criança que não vai tão bem na escola, o adolescente que se volta contra você.

Mães das mães, por outro lado, não são madrastas (outro estereótipo que precisamos atualizar). Na verdade, elas são o oposto disso. Uma pesquisa da Universidade Oxford com 1.500 crianças e adolescentes mostrou que, com a presença de avós, crianças se tornam adultos mais felizes. No último dia 9, a publicação científica PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America) trouxe um artigo que confirmou o resultado da pesquisa anterior –desta vez, não entre humanos, mas em outra espécie.

Pesquisadores americanos e canadenses estudaram dois grupos de baleias orcas assassinas por um extenso período, dos anos 1970 até 2016. As baleias orcas entram na menopausa entre o fim dos 30 e o começo dos 40 anos de idade, mas vivem por bastante tempo ainda, décadas, o que intrigava os cientistas. O motivo, segundo eles, ficou claro quando se percebeu que as avós aumentavam a chance de sobrevivência dos netos.

"Essa descoberta pode ajudar a explicar porque as orcas são, entre os animais não humanos, a espécie que mais vive depois da menopausa." Se, na natureza, mulheres maduras ajudam a espécie a sobreviver, por que insistimos em transformá-las em vilãs?

Está na hora de mudar isso aí.

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Sobre a autora

Brenda Fucuta é jornalista, escritora e consultora de conteúdo. Autora do livro “Hipnotizados: o que os nossos filhos fazem na internet e o que a internet faz com eles”, escreve sobre novas famílias, envelhecimento, identidade de gênero e direitos humanos. Além de entrevistar pessoas incríveis.

Sobre o blog

Reflexões de uma jornalista otimista sobre nossa vida em comum

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