Mudanças climáticas: somos a última geração a viver na zona de conforto?
Brenda Fucuta
22/09/2019 04h00
Foto: Markus Spiske/Unsplash
Por puro acaso, estou lendo o livro "A Terra Inabitável: Uma História do Futuro", do jornalista David Wallace-Wells (Companhia das Letras), na semana em que o mundo entra em greve para exigir medidas contra as mudanças climáticas.
O livro do jornalista virou best-seller nos Estados Unidos, onde foi escrito. Sua primeira linha: "É pior, muito pior do que você imagina".
Das cinco extinções em massa que nosso planeta experimentou, quatro foram causadas por mudanças climáticas produzidas pelo efeito estufa, diz o escritor. Há 250 milhões de anos, o gás carbônico aqueceu o planeta em 5°C "deixando a vida na terra por um fio". David Wallace-Wells avisa que, hoje, lançamos carbono na atmosfera com velocidade muitas vezes maior.
Em 2016, os representantes da humanidade assinaram um acordo em Paris para que o aquecimento não ultrapassasse 2°C. Dois problemas com isso: o primeiro, é que não estamos cumprindo a meta. Estima-se, segundo o autor, que cheguemos a 3,2°C de aquecimento no final do século, o que vai trazer "o impensável colapso das calotas polares. Com isso, ficam inundadas Miami, Daca, Xangai, Hong Kong, além de uma centena de outras cidades", entre outros efeitos catastróficos: desertificação das florestas tropicais, desastres climáticos contínuos e migrações humanas desesperadas por comida, água e lugar que não cozinhe o corpo.
O segundo problema: o aquecimento de 2°C já é suficiente para deixar o planeta bastante desconfortável para os vivos, entre eles nós, humanos. Habitamos este planeta há pouco tempo, mas estamos fazendo um estrago monumental nessa que já é chamada a Era do Homem –Antropoceno. Segundo David Wallace-Wells, apenas nas últimas três décadas (gente, dos anos 90 para cá!), nós soltamos mais do que a metade do gás carbônico da atmosfera. O que isso significa?
O efeito estufa ajuda a aquecer o planeta, sem ele, a gente congelava. Mas quando o efeito desregula, temos um aquecimento anormal. O site Brasil Escola, do UOL, explica que alguns fatores ampliam o efeito estufa. Quais são esses fatores? A emissão do gás carbônico, causado pela queima de combustíveis fósseis (petróleo, carvão), de gás metano –o pum dos rebanhos e dos lixões– e de outros gases, liberados principalmente pela atividade agrícola e industrial, além do aumento do vapor de água.
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Mas, se tudo que ele diz é verdade, como continuamos a posar de contentes? Como não paramos de andar de carro, de fazer compras desnecessárias, de consumir muita carne?
Como deixamos acontecer as queimadas nas florestas tropicais, da América do Sul e da Indonésia, responsáveis por umidificar o mundo, por provocar chuvas essenciais para a sobrevivência de todos? Sem chuva: sem lavoura. Sem chuva, sem água nas torneiras
Além de não querermos sair da bolha da fantasia, do escapismo, não gostamos da ideia de deixar de viver na maior zona de conforto da história –a do último século, quando boa parte da população passou a dormir em colchões macios, a andar de carro e de avião, a comer doce e hambúrger à vontade, a ter remédio para tirar a dor, a se acostumar com o ar fresco do ventilador e do ar-condicionado, a se deliciar com o banho quente. No máximo três gerações puderam desfrutar de tantos prazeres – do meio do século 20 para cá. Não é fácil largar mão disso tudo, assim como não é fácil sair da festa na hora em que ela está, sem trocadilhos, pegando fogo.
O escritor acredita que a gente não consegue materializar o perigo da catástrofe. Jogamos o perigo para frente, para alguma geração com a qual não conseguimos nos ligar afetivamente. Tataranetos, talvez? (Estima-se, no entanto, que, se nada fora da ordem acontecer, como a intervenção de uma tecnologia divina, a catástrofe chega em menos de 70 anos.) Mas, como diz a adolescente sueca de 16 anos que puxou o movimento jovem a favor das mudanças, Greta Thunberg, é a nossa casa que está pegando fogo agora.
Sobre a autora
Brenda Fucuta é jornalista, escritora e consultora de conteúdo. Autora do livro “Hipnotizados: o que os nossos filhos fazem na internet e o que a internet faz com eles”, escreve sobre novas famílias, envelhecimento, identidade de gênero e direitos humanos. Além de entrevistar pessoas incríveis.
Sobre o blog
Reflexões de uma jornalista otimista sobre nossa vida em comum