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Brenda Fucuta

Estudo mapeia quem são os chamados "Perennials", os novos velhos

Brenda Fucuta

03/03/2019 05h00

(iStock)

 

O envelhecimento pode ser um tempo de oportunidade e mudança. Esta é uma das principais conclusões de um estudo conduzido no mundo inteiro pela empresa britânica Ipsos Mori e lançado no começo de fevereiro. Otimista, o estudo diz que o fato de estarmos vivendo mais pode não ser novidade, mas o jeito que estamos gastando estes anos extras são. Batizado de Os Perennnials, o relatório da pesquisa mapeia um grupo de pessoas que reinventa a velhice e foge de estereótipos. Para falar do assunto, entrevistei Suzane Hall, 39 anos, diretora da unidade de Pesquisa Qualitativa da Ipsos Mori, e principal autora do relatório.

O que são os Perennials? Uma nova geração? Os Perennials não são exatamente uma geração, são mais um mindset. O termo foi criado por Gina Pell, uma empresária de tecnologia, em um artigo que publicou em 2016, Conheça os Perennials. Gina estava frustrada com a maneira como a sociedade enxergava as pessoas, como se elas só pudessem sair com gente da mesma idade. A empresária dizia que vivemos em uma era de rótulos e que, como consumidores, somos separados por idade. O mercado busca nos "catalogar e homogeneizar nossos interesses, hábitos de consumo, até mesmo nossos valores e referências morais. Mas a realidade é que muitos de nós não se alinham com os rótulos que recebemos. Então, Gina Pell apresentou o conceito dos Perennials. Como seu nome diz, eles são resistentes, mostram enorme capacidade de se adaptar a mudanças em seu ambiente. Eles evoluem, crescem de novo.

O que ela quis dizer com crescer de novo? Gina criou uma definição que vai desafiar os estereótipos e demandar uma nova visão do mercado e da sociedade sobre os mais velhos. Ela escreveu que os Perennials "estão sempre florescendo" porque vivem no tempo presente, possuem amigos de todas as idades e estão atualizados com a tecnologia.

No seu estudo, vocês descobriram que o conceito de velhice é cada vez mais relativo. Você pode explicar isso? Nossa pesquisa foi conduzida em 28 países e, como média global, a velhice começa aos 66 anos. Mas descobrimos muitas diferenças no modo como as pessoas a enxergam. Quanto mais velhas são as pessoas, mais tendem a definir velhice como algo que vai acontecer bem depois. Aqueles que estão com 16 a 24 anos acreditam que a velhice começa aos 61. Mas para quem tem entre 55 a 64 anos, ela começa aos 72.

Relatório sobre os perennials, da Ipsos Mori

O que mais te surpreendeu na pesquisa? Ao mesmo tempo que nossos entrevistados identificaram características positivas entre os mais velhos – por exemplo, que eles são gentis, sábios, respeitados e respeitosos –, eles também os descreveram como frágeis, solitários e tratados de forma injusta. Por causa disso, as pessoas não querem se identificar com a velhice, adiam o máximo que podem. Então, o que mais me surpreendeu foi a descoberta desta percepção tão negativa. Envelhecer é uma das maiores conquistas da nossa sociedade. Representa os enormes avanços na medicina e na melhoria nas condições de vida e de trabalho que conseguimos. Mesmo assim, apenas um a cada três de nós aguarda a velhice com otimismo. Em países como Japão e Hungria, a visão é particularmente pessimista.(Em 2050, calcula-se que quase metade, 42%, da população japonesa terá mais de 60 anos.) Nós realmente precisamos questionar nossas certezas sobre o envelhicimento. Será que estamos certos em ser tão negativos? A maioria dos estudos ocidentais mostra que pessoas mais velhas se sentem felizes. (O relatório da Ipsos cita estudos que mostram que, dos 65 até metade dos 70 anos, as pessoas demonstram grande sensação de bem-estar. Dos 40 aos 59, elas estão no nível mais baixo de felicidade).

E apesar disso, como vocês também descobriram, existe de fato um aspecto preocupante na velhice: a falta de dinheiroTodos nós precisamos começar a guardar dinheiro para nossa aposentadoria, apesar de sabermos das muitas barreiras para que isso aconteça. 51% dos nossos entrevistados acham que devem guardar dinheiro para velhice. Mas apenas 28% que dizem que já estão fazendo isso. Então, talvez, a gente precise incentivar as pessoas a poupar mais. Já existem políticas públicas que contribuem com esse pensamento. Na Inglaterra, a introdução do automatic enrolment, em 2012, tem aumentado o número de pessoas que estão poupando para a aposentadoria. Naquela época, apenas 42% dos trabalhadores participavam de um plano de aposentadoria. Agora, são 81%. (Automatic enrolment é uma iniciativa do governo britânico que obriga os empregadores a oferecer aos seus empregados a inscrição em planos de previdência.) Na Austrália, as reformas da previdência têm forçado os trabalhadores a poupar. Eles podem escolher onde o dinheiro é investido, o que criou um mercado altamente competitivo. Estas iniciativas estão na na direção correta, mas reformas radicais podem ser necessárias, como a escalada automática, que empurra as pessoas a poupar mais porque vincula aumentos salariais a aumentos nas contribuições de pensão. Os empregadores também precisam se adaptar ao fato de que vivemos mais e investir na viabilização de empregos para os mais velhos.

 Diante desse quadro, quais os maiores desafios, além do econômico, que os Perennials vão enfrentar? Há muitos desafios, mas talvez um dos mais difíceis de resolver seja a imagem negativa do envelhecimento. Para resolver isso, precisamos ver mais idosos em nossas telas. Um estudo americano descobriu que apenas 1,5% de todos os personagens na TV são idosos, e a maioria deles ocupa papéis menores. No cinema, a situação é apenas um pouco melhor. Também precisamos ver os idosos retratados de maneira mais realista, menos estereotipada. E precisamos entrar em contato com pessoas mais velhas! Amizades entre gerações beneficiam ambos os lados, mas são raras. Nossa pesquisa descobriu que pessoas com 55 a 64 anos são os menos propensos a ter amigos mais velhos (39% em comparação com 45% da população geral). Apesar de ser o grupo etário mais próximo dos idosos, eles não se preparam para o que está por vir e não aprendem com a experiência dos mais velhos.

Sobre a autora

Brenda Fucuta é jornalista, escritora e consultora de conteúdo. Autora do livro “Hipnotizados: o que os nossos filhos fazem na internet e o que a internet faz com eles”, escreve sobre novas famílias, envelhecimento, identidade de gênero e direitos humanos. Além de entrevistar pessoas incríveis.

Sobre o blog

Reflexões de uma jornalista otimista sobre nossa vida em comum

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