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Brenda Fucuta

Mulher velha não é mulher feia

Brenda Fucuta

08/09/2019 14h35

Brigitte Macron, esposa do presidente da França, com a primeira-dama do Chile, Cecilia Morel (Foto: Julien de Rosa/ AFP)

Então, vamos falar sobre feiúra. Não só sobre a feiúra da primeira-dama da França, Brigitte Macron, criticada pelo presidente brasileiro e seu ministro da Economia, mas sobre a feiúra das mulheres.

O que mais detona uma mulher? Ser chamada de burra? De puta? De perua? Puta e perua não são mais as piores críticas que se dirige a uma mulher, porque tanto uma quanto outra tem componentes que são valorizados hoje: a sensualização e a ostentação.

Burra? Loira burra? Para algumas, é péssimo – especialmente, no ambiente de trabalho –, para outras, nem tanto. Mas ser chamada de feia continuam sendo ruim para qualquer uma. E os homens sabem disso.

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Na semana passada, por exemplo, fui chamada de feia por um leitor deste blog. Não foi a primeira vez, mas admito que ainda me choca, embora saiba que chamar alguém de feio esteja no nível jardim de infância dos xingamentos. Crianças de 1,5 ano costumam ter um repertório de 150 palavras. Tenho certeza de que quatro delas são: chato, bobo, mau e feio.

Como é que um presidente de Estado e um ministro da Economia regridem ao ponto de chamar a primeira-dama de um país de feia? Não estou só falando da inacreditável e imperdoável falta de polidez, diplomacia, respeito e decoro exigidos pelos cargos que ocupam esses dois brasileiros. Mas de maturidade. Fico imaginando um bebê, de fraldas e chupeta, apontando para alguém e falando: feio! Feia! Quantos anos eles têm, afinal? Dois? Por que eles regrediram a esse ponto (67 anos de regressão, no caso do ministro e 62 anos, no caso do presidente)?

Porque apelar para a feiúra da mulher (e não de qualquer coisa) é nível 1 do machismo também. Mas isso fica um pouco repetitivo, já que ele, o próprio machismo, é uma condição regredida. Ou alguém ainda acredita que mulheres são inferiores aos homens? Ou não têm o direito de ter os mesmos direitos? Ou que existe fada do dente?

"Ah, mas a gente não precisa levar isso a sério. Foi bobo ele falar isso, mas foi só uma brincadeirinha." Uma bobagenzinha de uma criança levada, certo?

Não, não foi. Mesmo que a gente queira ser politicamente incorreto, chamar a mulher de Macron de feia é inaceitável. Se ela, Brigitte, quisesse responder no mesmo nível regredido, ela poderia dizer: "O que vem de baixo não me ofende". (Ok, seria um nível mais avançado, exige mais palavras do vocabulário.)

Sua filha, Tiphaine Auziere, como resposta, lançou uma campanha com o slogan Jogue fora a sua misoginia. Achei legal ela ter feito isso em defesa da mãe. Levantou o nível do debate, sem dúvida. Mas acho que falta falar mais da verdadeira motivação atrás do xingamento. Brigitte não é feia – segundo o Manual Universal da Beleza e da Feiúra do século 21. Brigitte é velha. Tem 66 anos. 25 a mais do que o marido. Quando Macron virou presidente, o assunto não era a suposta feiúra de sua mulher, mas a diferença de idade entre eles.

Nosso presidente, 27 anos mais velho do que sua primeira-dama, talvez não tenha querido dizer o que disse, afinal. Ele talvez tenha querido xingar Brigitte de velha e ponto. Oportunidade para eu dizer: velho não é feio. Aliás, seu eleitorado será majoritariamente velho em pouco tempo. Brasileiras velhas serão maioria. E elas não serão feias.

Não, velho não é feio. Feio é o comportamento de um homem regredido. #Desculpa Brigitte.

 

Sobre a autora

Brenda Fucuta é jornalista, escritora e consultora de conteúdo. Autora do livro “Hipnotizados: o que os nossos filhos fazem na internet e o que a internet faz com eles”, escreve sobre novas famílias, envelhecimento, identidade de gênero e direitos humanos. Além de entrevistar pessoas incríveis.

Sobre o blog

Reflexões de uma jornalista otimista sobre nossa vida em comum

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