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Brenda Fucuta

Os pais estão perdendo o controle no grupo do WhatsApp da escola

Brenda Fucuta

25/05/2019 04h57

Foto: Rachit Tank/Unsplash

A intenção é sempre boa: compartilhar informações entre pais e mães cujos filhos estudam na mesma escola. Mas, em pouco tempo, os grupos de pais no WhatsApp descarrilam, perdem a rota. "Em vez de serem os facilitadores poderosos que potencialmente poderiam ser, os aplicativos estão causando confusão entre as famílias", diz Adriana Schneider Dalollio, que está conduzindo uma pesquisa de doutorado na Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas sobre comportamento pré-adolescente. "Uma série de conversas paralelas tira o foco da educação dos filhos". Os grupos de pais foram um achado da pesquisa de Adriana, cuja tese gira em torno do consumo de imagem de meninas de 10 a 12 anos. "Como estou entrevistando muitos educadores, o assunto dos grupos de WhastApp sempre aparece e as escolas estão preocupadas com isso." Nesta entrevista, Adriana, que é mãe de uma adolescente de 13 anos e de um pré-adolescente de 11, revela um pouco de suas descobertas.

O que vem chamando sua atenção na pesquisa sobre os tweens? Comecei pensando em pesquisar o consumo entre tweens e percebi rapidamente que esta geração consome mais imagem do que marca, porque a interação entre eles se dá cada vez mais pelas redes sociais do celular que são preponderantemente baseadas em imagens, como o Instagram e o Snapchat.

E quais as consequências desta interação? Há uma mudança de roteiro, especialmente no ritmo e no processo das decisões. Na nossa época, quando a gente queria marcar um programa com uma colega, iniciava a combinação na escola e, a partir daí, os pais assumiam e podia demorar dias. Eram eles que decidiam quando, como e onde. Hoje, estas etapas são cortadas. Os tweens combinam tudo no celular e os pais entram apenas no final, para o transporte. Os aplicativos estão acelerando os processos e isso gera uma dificuldade para os pais, que perdem o controle das interações dos filhos. E, para falar a verdade, nós, pais, estamos perdendo o controle das nossas próprias interações.

Como assim?
A gente recebe muita comunicação, o tempo todo: emails, Facebook, WhatsApp, Instagram. Os grupos de pais acabam filtrando todo este material e isso é bom. O WhatsApp pode ser uma ferramenta maravilhosa para pais que querem conhecer outros pais, que querem trocar dicas, falar sobre suas angústias, perguntar sobre coisas que perdeu na comunicação formal da escola. Mas os educadores que entrevistei se queixam desses grupos porque acreditam que, em vez de facilitar, eles estão dificultando as relações: entre a escola e a família, entre pais e entre as próprias crianças.

Por quê? Por vários motivos. Os grupos amplificam questões de forma desnecessária, o tal do efeito megafone, e viram plataforma para assuntos que não têm nada a ver com educação. Discussões políticas são um ótimo exemplo. Outra coisa que acontece muito é a confusão entre o público e o privado. Na ânsia de ajudar e de tentar resolver problemas, muitas vezes nós, pais, acabamos expondo os filhos.

Por exemplo? Encontrei histórias de pais que publicam print screen das conversas dos filhos com colegas nos grupos de WhatsApp. Os pais, em geral, querem mostrar que o filho foi ofendido, que foi injustiçado, mas não percebem que estão expondo a criança ao publicar o nome e o sofrimento dela em uma arena pública. Muitos pais e mães entram na briga do filho, invadindo o grupo das crianças. Ouvi falar do caso de um pai que se fez passar pelo filho para responder por ele no grupo. Também aparecem exemplos de superproteção.

Que tipo? Mães que pedem ao grupo que enviem a lição de casa, de preferência pronta, para que o filho possa copiar, porque ele faltou ou perdeu a tarefa. Ou ficam perguntando pelo livro que a escola encomendou. Como mãe, eu entendo a aflição, a vontade de ajudar o filho. Mas estamos tirando a responsabilidade das crianças, ocupando um papel que é delas e minando sua autonomia.

Que recomendações você daria para que esses grupos fossem mais eficientes? Há catorze anos, eu fiz um curso sobre a etiqueta do email. Lembro que a professora recomendava que a gente nunca respondesse de imediato a uma mensagem. Acho que a mesma coisa vale para o WhatsApp. É muito fácil escrever e compartilhar mensagens no impulso. O ser humano aprendeu a interagir na socialização face a face. A interação digital é muito nova. A gente precisa aprender a criar filtros digitais para que os grupos sejam mais saudáveis, para que discutam assuntos mais relevantes para as crianças. E sem excluir a escola.

E no caso dos pré-adolescentes? Vejo muitos pais preocupados em monitorar o que o filho faz na internet… É verdade. Mas a gente tem que entender que é impossível. A cada entrevista que faço com uma menina, descubro um novo influencer, um novo joguinho, uma nova atividade, um novo canal no Instagram. Não dá para acompanhar, não dá para checar 24 horas por dia o que eles estão vendo na tela.

Você tem dois filhos. Como faz? Acho que a gente tem que acreditar na conversa com os filhos. Mas não adianta querer conversar sobre tudo que o filho fez ou viu na internet. Acredito no diálogo sobre preservar a vida privada e social, respeitar as diferenças das pessoas do grupo, tomar cuidado com as palavras – porque elas podem ser interpretadas de maneira diferente da original. Muitas vezes, meus filhos reclamam: "mãe, eu já sei disso". Aprendi a responder que o papel de mãe é assim mesmo. Ser chata é a nossa profissão.

Leia também: Eu zapo, tu zapas, como a vida mudou em 10 anos de WhatsApp, Uma hora por dia, OMS recomenda que crianças de 5 anos usem telas 1 hora por dia, Grupos de pais no WhatsApp: amar ou odiar?

Sobre a autora

Brenda Fucuta é jornalista, escritora e consultora de conteúdo. Autora do livro “Hipnotizados: o que os nossos filhos fazem na internet e o que a internet faz com eles”, escreve sobre novas famílias, envelhecimento, identidade de gênero e direitos humanos. Além de entrevistar pessoas incríveis.

Sobre o blog

Reflexões de uma jornalista otimista sobre nossa vida em comum

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