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Brenda Fucuta

O presente que toda mãe tem direito de ganhar no dia 12

Brenda Fucuta

05/05/2019 04h05

O melhor presente: não é isso que você está pensando.                           Foto: Nathan Cowley/ Pexels

 

"O que você quer ganhar no dia das mães?" – meus filhos perguntam.

"Um Kindle com luzinha."

"Não dá, mãe. O dinheiro não chega."

"Então quero louça lavada. Casa varrida. Areia do gato trocada. Todo dia."

"Ah, mas assim também é demais, mãe. Fala sério."

"Não custa nada, é mais barato que o Kindle."

"A gente vai levar café da manhã pra você, tá?"

"Todo dia?"

Eu adoro o café da manhã na cama e o dia de paparicos no segundo domingo de maio (escrevi sobre isso, inclusive, no ano passado). Mas, agora, quero mais. Meus filhos reclamam que estou monotemática, só falo da divisão das tarefas domésticas. É chato – principalmente para mim, ao contrário do que eles pensam. No entanto, esta é a minha causa, algo que, hoje, vejo como uma obrigação educativa.

Meus filhos cresceram entendendo que as mulheres são seres capazes, autônomos, não precisam ser tuteladas. São homens feministas, se isso for possível. Mas ainda não entenderam que a mãe deles é mulher, não uma heroína da Marvel.

Na minha opinião, o melhor presente que uma mãe pode receber: ser remunerada pelo seu trabalho nas tarefas domésticas. Calcula-se que, em média, as mulheres tenham uma carga horária de 12 horas semanais maior do que a dos homens, somando o trabalho pago (fora de casa) e a segunda jornada, a da louça, da roupa, da comida, da lição de escola com os filhos. Parte desta carga horária é gratuita, não custa nada a ninguém, só a quem a cumpre.

Mas, sendo impossível ser remunerada, que tal distribuir melhor este trabalho? Sei que é uma meta difícil para alcançar. Criamos uma geração que ou acreditou na falácia da mãe polvo, multitarefas, ou teve uma emprega doméstica deixando a casa parecendo um flat.

Sendo mães, somos culpadas por isso também? Não. A explicação vai além de nós. "Ao longo da história as mulheres assumiram como papel 'natural' a provisão de cuidados da família, enquanto os homens o sustento financeiro. Isso contribuiu com a crença social de que a família é responsabilidade da mulher e o trabalho, por seu turno, do homem', explicam os economistas Luana Passos e Dyeggo Rocha Guedes, no artigo Participação feminina no mercado de trabalho e a crise de cuidados da modernidade: conexões diversas. "O chamado 'trabalho produtivo' é exercido pelos homens, enquanto as mulheres compartilham seu tempo 'naturalmente' entre a produção de mercadorias fora de casa, a execução das tarefas domésticas e os cuidados da família – o dito 'trabalho reprodutivo'".

Segundo dados da PNAD (Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios) de 2105, citados pelos economistas, "por volta de 19% das mulheres economicamente ativas, de 16 a 59 anos, tinham, simultaneamente, ao menos um idoso e uma criança de 0-6 anos no domicílio".

Você pode estar pensando que eu estou exagerando, que os centennials – esta geração que nasceu no século 21 –, vai ser diferente. Pode ser, mas o fato é que ainda hoje, no mundo, as meninas (entre 5 anos e 14) trabalham 160 milhões de horas a mais do que os garotos em tarefas domésticas, conforme relatório do Unicef, o Fundo das Nações Unidas para a Infância, Harnessing the Power of Data Girls, de 2016O que este número quer dizer? Quer dizer que a gente ainda está reproduzindo uma doença social, a crença de que o trabalho domestico é feminino exclusivamente, não precisa ser remunerado e, portanto, não tem valor. E o que não tem valor, fica invisível. Por isso, talvez, os filhos que criamos enquanto acumulamos o trabalho remunerado com o trabalho doméstico ainda acreditem em fantasias. Tipo:

  • louças se lavam sozinhas.
  • o lixo anda até a lixeira.
  • a máquina de lavar roupa, além de pegar a roupa no cesto, seca, dobra e guarda na gaveta. Sem misturar cuecas com camisetas.
  • existe um duende que, à noite, varre a casa, limpa os móveis e faz a comida aparecer na mesa.
  • ah, o duende também leva o cachorro para passear.

 

Sobre a autora

Brenda Fucuta é jornalista, escritora e consultora de conteúdo. Autora do livro “Hipnotizados: o que os nossos filhos fazem na internet e o que a internet faz com eles”, escreve sobre novas famílias, envelhecimento, identidade de gênero e direitos humanos. Além de entrevistar pessoas incríveis.

Sobre o blog

Reflexões de uma jornalista otimista sobre nossa vida em comum

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