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Brenda Fucuta

Depois que passa o Dia das Mães, a gente acorda de ressaca

Brenda Fucuta

13/05/2018 16h39

Créditos: Austin Neill/Unsplash

No Dia das Mães, costumo ganhar café da manhã na cama. Espero acordada, fazendo de conta que estou dormindo, mesmo hoje, quando o meu filho mais velho tem mais de 30 anos e o caçula, 14. Tomo o suco de laranja, como o mamão em pedaços, experimento o pão torrado e saboreio o café. É um café simples, do jeito que eu gosto (e do jeito que eu faço todo dia). Meus filhos ficam ao redor, sentados na cama comigo, esperando que eu me sinta bem, que esteja satisfeita com o mimo.

É nossa pequena tradição e ela me faz tão feliz quanto os presentes de Natal que recebia na infância.

Tem gente que não gosta de massagem, de surpresas ou de chocolate. Mas não conheço ninguém que não gosta de demonstrações de amor feitas pelas pessoas que ama. Então, mesmo sabendo que o Dia das Mães é meio forçado, que a sua origem é suspeita – criada pelo mercado de consumo, tal e tal ­–, eu adoro esta data mais do que qualquer outra.

Será que isso tem a ver com a inversão de papéis? Uma vez por ano ser cuidada em vez de cuidar? Ser paparicada em vez de paparicar? Teria a ver com a fantasia de (quase) toda mãe de estar com seus filhos por perto, a ninhada ao redor? Ou existiria uma explicação mais mesquinha, mas ainda assim muito plausível: nessa data, temos controle absoluto sobre o nosso reino? Mães são, acima de tudo, loucas por controle (sei que tem gente que não é assim, mas estou falando da média, do padrão da maioria). Consciente ou inconscientemente, queremos controlar nosso filhos para que eles não se distanciem muito do ideal que projetamos em seus nascimentos. Queremos filhos inteligentes, bons de coração, adaptados, cheios de amigos, profissionais realizados.  Queremos que eles cumprimentem as pessoas e segurem a porta do elevador para os mais velhos. Queremos ter orgulho deles. Queremos que eles sejam respeitados e respeitem os colegas de escola, de trabalho. Que eles sejam amados por quem eles escolherem amar. Existem variações ­– a depender dos valores, credos e esperanças de cada mãe. Mas, em geral, torcemos para que eles sejam melhores do que nós, que nos superem e, assim, levem nossos genes aprimorados para a posteridade.

Com o passar do tempo, como grande parte das mães descobre, os filhos se rebelam e subvertem esses planos. Às vezes demoram mais, às vezes são precoces, mas costumam achar seu próprio caminho em algum momento, à revelia do que achamos, pensamos ou gostamos. Filhos são destinados a se emancipar.

Para as mães, o Dia das Mães talvez seja, portanto, uma maneira de celebrar sua própria ilusão sobre os filhos. Um momento em que eles estão próximos o suficiente para nos fazer lembrar que, sim, eles já foram nossos. Mas distantes o bastante – porque o dia não dura mais do que 24 horas – para que possamos acordar, despertar da nossa fantasia onipotente. Dar espaço para que nos reconciliemos com a ideia de que eles são deles mesmos; já voaram para o mundo.

Sobre a autora

Brenda Fucuta é jornalista, escritora e consultora de conteúdo. Autora do livro “Hipnotizados: o que os nossos filhos fazem na internet e o que a internet faz com eles”, escreve sobre novas famílias, envelhecimento, identidade de gênero e direitos humanos. Além de entrevistar pessoas incríveis.

Sobre o blog

Reflexões de uma jornalista otimista sobre nossa vida em comum

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